26.6.06

A velha caixa de costura

Dispersa e pelo mundo espalhada, difusa e por alguns repartida, sento-me à mesa des costura com o propósito doméstico de me remendar. São os velhos trapos dos sonhos antigos, vestidos de boneca, ridículos porque inocentes, as rendinhas vaporosas dos primeiros atrevimentos, a blusa rasgada daquele dia de lágrimas violentas. Reunindo-me no que me sobeja, tento encontrar, cerzindo-me nos rasgões da alma dilacerada, ponteando-me nos buracos da traça monótona no que armazenei. Olhando-me assim, desse teu modo penetrante e profundo, sorris-me, quase imperceptível. Boneca de trapos num sótão esquecia, aceno-te o desejo, beijo-te com sofreguidão os teus anseios.